Boletins Jurídicos

Revogação Tácita da Lei n. 8.009/90 pelo Código de Processo Civil e a Coexistência dos Bens de Família

A questão da revogação tácita da Lei n. 8.009/1990 pelo Código de Processo Civil (CPC) tem gerado intenso debate entre juristas e operadores do direito. É importante esclarecer que não se verifica a revogação dessa norma, que estabelece a proteção dos bens de família, uma vez que tanto o bem de família legal quanto o voluntário coexistem harmoniosamente, sem que um exclua o outro.

Os artigos 1º e 5º da Lei n. 8.009/1990 conferem uma proteção robusta aos bens de família, e a interpretação de que tais dispositivos teriam sido tacitamente revogados pelo CPC não encontra respaldo na própria legislação processual. O CPC, em seu artigo 832, afirma que não estão sujeitos à execução os bens que a lei classifica como impenhoráveis ou inalienáveis, abrindo espaço para a coexistência de diferentes normas que garantem essa proteção.

Ademais, a ideia de que o artigo 833 do CPC teria esgotado as situações de impenhorabilidade contraria a tradição do ordenamento jurídico brasileiro, que sempre reconheceu a possibilidade de regulamentação do bem de família por diversas leis e normas, como demonstram as disposições do Código Civil de 1916 e do Código Civil de 2002, além da própria Lei n. 8.009/1990.

É relevante destacar que a assertiva do CPC, que menciona em seu artigo 833, inciso I, a impenhorabilidade dos bens “declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução”, não implica na revogação dos dispositivos da Lei n. 8.009/1990. Esta última norma aborda especificamente a impenhorabilidade do bem de família de menor valor, estabelecendo que a proteção é mantida mesmo na ausência de registro formal como bem de família, conforme expresso no caput e parágrafo único do artigo 5º.

Portanto, a coexistência entre o bem de família voluntário, regulado pelo artigo 1.711 do Código Civil e pelo artigo 833, inciso I, do CPC, e o bem de família legal, conforme disposto na Lei n. 8.009/1990, é inegável. Um imóvel que não esteja registrado como bem de família não se torna automaticamente penhorável, em virtude das disposições protetivas contidas nos artigos 1º e 5º da referida lei.

– STJ, 1ª Turma, REsp 2.133.984-RJ, Rel. Ministro Paulo Sérgio Domingues, j. 25.10.24 – inteiro teor.

REGINALDO FERRETTI
OAB/SP n. 244.074

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