Boletins Jurídicos

Conversão da Obrigação de Fazer em Perdas e Danos independentemente do Pedido

A questão da obrigação de fazer, em sua relação com a tutela específica e a conversão em perdas e danos, apresenta nuances relevantes no ordenamento jurídico brasileiro. A possibilidade de transformar uma obrigação de natureza específica em reparação pecuniária, independentemente de solicitação do titular do direito, é um aspecto que merece uma análise aprofundada.

No Direito brasileiro, a tutela específica é a regra geral para as obrigações de fazer e não fazer. A conversão em perdas e danos é permitida em duas circunstâncias principais: (a) mediante solicitação expressa do credor, mesmo que a obrigação ainda possa ser cumprida na forma específica; ou (b) quando a obtenção da tutela específica se torna impossível ou não há como alcançar um resultado prático equivalente ao cumprimento voluntário. Essa disposição encontra respaldo no artigo 499, do Código de Processo Civil.

Ademais, é necessário considerar os preceitos do Código Civil ao estabelecer que o devedor que recusa cumprir uma obrigação imposta, ou que somente ele pode executar, incorre na responsabilidade de indenizar por perdas e danos. Referido diploma legal, nos artigos 247, 248, 249 e 389, determina que o não cumprimento da obrigação implica em reparação financeira, incluindo juros, atualização monetária e honorários advocatícios.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reiterado, em suas decisões, a possibilidade de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos, independentemente de pedido por parte do titular do direito, inclusive durante a fase de cumprimento de sentença, quando a impossibilidade de cumprimento da tutela específica é constatada. Exemplos dessa jurisprudência incluem os julgados AgInt no RMS n. 39.066/SP, relator Ministro Gurgel De Faria, e AgInt no REsp n. 1.779.534/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, entre outros.

Além disso, as Turmas de Direito Público do STJ também têm reconhecido a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos em situações onde se verifica negligência ou demora do réu na execução da tutela específica. Decisões como a do AgInt no AREsp n. 1.205.100/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, evidenciam essa tendência.

Diante desse panorama, conclui-se que, na eventualidade de a mora do devedor impossibilitar a concessão da tutela específica pleiteada, a obrigação pode ser convertida, de ofício, em qualquer fase do processo, em reparação por perdas e danos. Isso ocorre sem prejuízo da imposição de multa para compelir o réu ao cumprimento específico da obrigação, enquanto esta ainda for viável. Assim, essa conversão não implica, automaticamente, na carência superveniente do interesse processual.

Esta análise evidencia a importância de compreender as dinâmicas entre as obrigações de fazer, a tutela específica e a conversão em perdas e danos, refletindo a evolução do entendimento jurisprudencial e a aplicação prática das normas pertinentes.

– STJ, 1ª Turma, AgInt no RMS n. 39.066/SP, Relator Ministro Gurgel de Faria, j. 12.4.21 – inteiro teor.

– STJ, 2ª Turma, AgInt no REsp n. 1.779.534/RJ, Relator Ministro Herman Benjamin, j. 23.5.19 – inteiro teor.

– STJ, 1ª Turma, AgInt no AREsp n. 1.205.100/SP, Relator Ministro Sérgio Kukina, j. 19.3.19 – inteiro teor.

– STJ, 1ª Turma, REsp 2.121.365/MG, Relatora Ministra Regina Helena Costa, j. 3.9.2024 – inteiro teor.

REGINALDO FERRETTI
OAB/SP n. 244.074

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